quarta-feira, 26 de setembro de 2012

A flor



O local estava deserto quando me sentei para ler embaixo dos longos ramos de um velho carvalho. Desiludido da vida, com boas razões para chorar, pois tinha a impressão que o mundo estava tentando me afundar.
 E se não fosse razão suficiente para me arruinar o dia, um garoto ofegante chegou perto de mim, cansado de brincar. Ele parou na minha frente, cabeça pendente, e disse cheio de alegria:
- Veja o que encontrei!
Na sua mão uma flor. E que visão lamentável! Estava murcha com muitas pétalas caídas...
Querendo ver-me livre do garoto com a sua flor, fingi um pálido sorriso e virei-me. Mas ao invés de recuar, ele sentou-se ao meu lado, levou a flor ao nariz e declarou com estranha surpresa:
- O cheiro é ótimo, e é bonita também... Por isso peguei nela. Pegue-a, é sua!
A flor à minha frente estava morta ou morrendo. Nada de cores vibrantes como laranja, amarelo ou vermelho, mas eu sabia que tinha que pegá-la, ou ele jamais sairia de lá. Então estendi-me para pegá-la e respondi:
- Era o que eu precisava...
Mas, ao invés de colocá-la na minha mão, ele segurou-a no ar sem qualquer razão. Nessa hora notei, pela primeira vez, que o garoto era cego, e que não podia ver o que tinha nas mãos. Senti a minha voz sumir. Lágrimas despontaram ao sol, enquanto lhe agradecia por escolher a melhor flor daquele jardim.
- De nada... Respondeu sorrindo.
E então voltou a brincar sem perceber o impacto que teve no meu dia.
Sentei-me e comecei a pensar como ele conseguiu enxergar um homem auto-piedoso sob um velho carvalho. Como ele sabia do meu sofrimento auto-indulgente? Talvez no seu coração ele tenha sido abençoado com a verdadeira visão. Através dos olhos de uma criança cega, finalmente entendi que o problema não era o mundo, mas sim EU! E por todos os momentos em que eu mesmo fui cego, agradeci por ver a beleza da vida e apreciar cada segundo que é só meu. Então levei aquela feia flor ao meu nariz e senti a fragrância de uma bela flor, e sorri enquanto via aquele garoto com outra flor em suas mãos prestes a mudar a vida de um insuspeito senhor de idade...

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