segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

A vaca no precipício



Um filósofo e seu discípulo resolveram fazer uma pesquisa e saber como viviam as pessoas na sua região. Chegando à primeira residência, foraa recebidos pelos moradores: um casal com cinco filhos - todos com roupas limpas, porém rasgadas. Depois de servir um cafézinho dispôs-se a responder as perguntas do visitante.
- O senhor está no meio desta floresta, não há nenhum comércio nas redondezas - observou o mestre ao pai de família.  Como sobrevivem aqui?
E o homem, calmamente, respondeu:
- Meu amigo, a situação é muito difícil. Graças a Deus, temos aqui uma vaquinha que não nos deixa passar fome. Às vezes sobra um pouco de leite e fazemos um pouco de queijo e vendemos na cidade vizinha. E assim vamos sobrevivendo.
O filósofo agradeceu pela informação, comtemplou o lugar por um momento e foi embora. No meio do caminho, disse ao discípulo:
- Jogue a vaquinha deste pobre homem no precipício.
- Não posso fazer isso, é a única forma de sustento da família! - Espantou-se o discípulo.
O filósofo permaneceu calado. Sem alternativa, o rapaz fez o que lhe mandara o mestre, e a vaquinha morreu na queda. A cena ficou gravada em sua memória.
Muitos anos depois, já um empresário bem sucedido, o ex-discípulo resolveu voltar ao mesmo lugar, contar tudo à família, pedir perdão e ajudá-la financeiramente. Chegando lá, para sua surpresa, encontrou o local transformado num belíssimo sítio, com árvores floridas, carro na garagem e rapazes e moças bem vestidos e felizes. Ficou desesperado, imaginando que a humilde família tivesse precisado vender o sítio para sobreviver. Apertou o passo e foi recebido por um caseiro muito simpático.
- Para onde foi a família que vivia aqui há dez anos? - perguntou.
- Continuam donos do sítio - foi a resposta.
Espantado, ele entrou correndo na casa, e o senhor logo o reconheceu. Perguntou como estava o filósofo, mas o rapaz nem respondeu, pois se achava ansioso demais para saber como o homem conseguira melhorar tanto o sítio e ficar tão bem de vida.
- Bem, nós tinhamos uma vaquinha, mas ela caiu no precipício e morreu - disse o senhor. - Então, para sustentar minha família, tive que plantar ervas e legumes. Como as plantas demoravam a crescer, comecei a cortar madeira para vender. Ao fazer isso, tive que replantar as árvores e precisei comprar mudas. Ao comprar mudas, lembrei-me da roupa de meus filhos e pensei que talvez pudesse cultivar algodão. Passei um ano difícil, mas quando a colheita chegou, eu já estava exportando legumes, algodão e ervas aromáticas. Nunca havia me dado conta de todo o meu potencial aqui: ainda bem que aquela vaquinha morreu. Era um atraso em nossas vidas.

sábado, 1 de dezembro de 2012

A inveja do rei

Uma grande carestia afligia a aldeia: ninguém tinha que comer e só um milagre poderia salvar os seus habitantes. Bani não se resignava e cada dia saía de casa à procura de alimento na floresta. Mas o calor tinha secado tudo e era cada vez mais difícil encontrar algo que comer. Um dia, já de regresso à aldeia de mãos vazias, encontrou entre os espinhos uma cabaça de forma alongada. Quando parou e olhou para ela, ouviu uma voz: «Onde vais, sozinho pela floresta?»

Olhou em redor, mas não viu ninguém. Era mesmo a cabaça que lhe falava! Encheu-se de coragem e explicou-lhe que procurava alimento para ele e a família. Ela respondeu-lhe: «Hoje ganhaste o dia: tira-me destes espinhos e pergunta-me o que sou capaz de fazer por ti.» Bani não se fez repetir a ordem, recolheu a cabaça e limpou-a com as mãos, perguntando-lhe: «Cabaça da forma alongada, que sabes tu fazer por mim?» A cabaça começou a vibrar com força e a dizer: «Dou-te papas, dou-te papas!» E imitou o gesto que se faz quando se tiram as papas de milho da panela. E o bonito foi que Bani se encontrou com um prato de papas, que comeu até se saciar, tal era a fome que sentia. Depois de comer, a cabaça disse-lhe: «Leva-me contigo e farás feliz a tua família.»

Bani levou a cabaça debaixo do braço e guardou-a na sua cabana. E com ela, quando chegou a noite, deu de comer à sua família. Bani tinha um irmão, de nome Sani e língua cumprida. Comeu também a sua porção de papas, mas de manhã cedo foi logo dizer ao rei o segredo da cabaça. E o rei, de imediato, mandou chamar Bani. «Ouvi dizer que encontraste uma cabaça que trouxe a felicidade à tua família», disse-lhe o rei, perguntando de que se tratava. Bani contou-lhe a história e mostrou-lhe a cabaça.

O rei fez como Bani lhe contou e perguntou: «Cabaça da forma alongada, que sabes fazer por mim?» Ela respondeu: «Sei dar-te papas!» E de novo, também o rei se encontrou com um belo prato de papas, que comeu com gosto. Mas, para surpresa de Bani, em vez de lhe devolver a cabaça, ficou com ela dizendo: «Trata-se de um assunto que, claramente, diz respeito ao rei, guardar a cabaça.»

Bani ficou furioso e na manhã seguinte não teve outro remédio senão voltar à floresta à procura de alimento. Teve outra surpresa. Viu outra cabaça, de forma diferente, muito mais comprida, que parecia um tubo, um bastão comprido, um grande cacete. «Aonde vais sozinho e zangado?», perguntou-lhe a cabaça. E Bani contou-lhe a história: «Encontrei uma cabaça capaz de dar de comer a toda a minha família e à aldeia, mas o rei tirou-ma e ficou com ela.» A cabaça disse-lhe de novo: «Pergunta-me o que posso fazer por ti.» Ele obedeceu-lhe e ela, agitando-se ameaçadoramente respondeu: «Bater-te, bater-te!» Bani ficou meio atordoado com a pancada, mas depois pensou: «Conheço alguém a quem esta cabaça vai dar uma lição!»

Levou a cabaça debaixo do braço e foi apresentar-se ao rei, dizendo-lhe que tinha encontrado uma cabaça ainda mais prodigiosa que a outra. O rei nem esperou por mais explicações e fez a pergunta: «Cabaça da forma de bastão, que sabes fazer pelo rei da aldeia?» A cabaça começou a agitar-se ameaçadoramente e golpear o rei na cabeça, sem parar. O rei gritava de medo e de dor e apanhou uma valente sova, antes que o filho e os servos conseguissem dominar a cabaça. Depois retirou-se nos seus aposentos, sem contar a história a ninguém.

Desde então na aldeia todos sabem que não é bonito ter inveja daquilo que os outros têm e que não convém a ninguém, nem ao rei, deixar-se dominar pela inveja. Quando se é invejoso pode acontecer que se procure papas de milho e arroz e se encontre lágrimas e sofrimento.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O Filho



Um homem muito rico e seu filho tinham grande paixão pelas artes. Tinham de tudo em sua coleção, desde Picasso até Rafael. Muito unidos, se sentavam juntos para admirar as grandes obras de arte. Por uma desgraça do destino, seu filho foi para guerra. Foi muito valente mas morreu na batalha, quando resgatava outro soldado. O pai recebeu a notícia e sofreu profundamente a morte de seu único filho.
Um mês mais tarde, alguém bateu à sua porta... Era um jovem com uma grande tela em suas mãos e foi logo dizendo ao pai:
- O senhor não me conhece, mas eu sou o soldado por quem seu filho deu vida, ele salvou muitas vidas nesse dia e estava me levando a um lugar seguro quando uma bala lhe atravessou o peito, morrendo instantaneamente. Ele falava muito do senhor e de seu amor pelas artes.
O rapaz estendeu os braços para entregar a tela:
- Eu sei que não é muito, e eu também não sou um grande artista, mas sei também que seu filho gostaria que o senhor recebesse isto...
O pai abriu a tela. Era um retrato de seu filho, pintado pelo jovem soldado. Ele olhou com profunda admiração a maneira com que o soldado havia capturado a personalidade de seu filho na pintura. O pai estava tão atraído pela expressão dos olhos de seu filho, que seus próprios olhos encheram-se de lágrimas. Ele agradeceu ao jovem soldado, e ofereceu- se para pagar-lhe pela pintura.
- Não, senhor, eu nunca poderei pagar o que seu filho fez por mim ! Essa pintura é um presente...
O pai colocou a tela à frente de suas grandes obras de arte, e a cada vez que alguém visitava sua casa, ele mostrava o retrato do filho, antes de mostrar sua famosa galeria.
O homem morreu alguns meses mais tarde e se anunciou um leilão de todas as suas obras de arte. Muita gente importante e influente chegou ao local, no dia e horário marcados, com grandes expectativas de comprar verdadeiras obras de arte. Em exposição estava o retrato do filho. O leiloeiro bateu seu martelo para dar início ao leilão:
- Começaremos o leilão com o retrato "O FILHO". Quem oferece o primeiro lance ? Quanto oferecem por este quadro?
Um grande silêncio... Então um grito do fundo da sala:
- Queremos ver as pinturas famosas !!! Esqueça-se desta !!!
O leiloeiro insistiu:
- Alguém oferece algo por essa pintura? R$ 100,00? R$ 200,00?
Mais uma vez outra voz:
- Não viemos por esta pintura, viemos por Van Gogh, Picasso !!! Vamos às ofertas de verdade...
Mesmo assim o leiloeiro continuou:
- Quem leva "O FILHO"?
Finalmente, uma voz:
- Eu dou R$ 10,00 pela pintura...
Era o velho jardineiro da casa. Sendo um homem muito humilde era o único dinheiro que podia oferecer.
- Temos R$ 10,00! Quem dá R$ 20,00?" - gritou o leiloeiro.
As pessoas já estavam irritadas, não queriam a pintura do filho, queriam as que realmente eram valiosas para sua coleção. Então o leiloeiro bateu o martelo:
- Dou-lhe uma, dou-lhe duas, vendido por R$ 10,00!!!
- Agora, vamos começar com a coleção! - Gritou um.
O leiloeiro soltou seu martelo e disse:
- Sinto muito damas e cavalheiros, mas o leilão chegou ao seu final.
- Mas, e as pinturas? - Perguntaram os interessados.
- Eu sinto muito, - disse o leiloeiro, - quando me chamaram para fazer o leilão, havia um segredo estipulado no testamento do antigo dono. Não seria permitido revelar esse segredo até esse exato momento. Somente a pintura O FILHO seria leiloada; aquele que a comprasse, herdaria absolutamente todas as suas posses, inclusive as famosas pinturas. O homem que comprou O FILHO fica com tudo !...

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Orquestra da Amizade



Diz uma lenda árabe que dois amigos viajavam pelo deserto e num determinado ponto da viagem, discutiram e um deu uma bofetada no outro.
O outro ofendido, sem nada poder fazer, escreveu na areia:
HOJE O MEU MELHOR AMIGO DEU-ME UMA BOFETADA NO ROSTO.

Seguiram e adiante chegaram a um oásis onde resolveram banhar-se. O que havia sido esbofeteado e magoado começou a afogar-se, sendo salvo pelo amigo.
Ao recuperar-se, pegou num canivete e escreveu numa pedra:
HOJE O MEU MELHOR AMIGO SALVOU-ME A VIDA.

Intrigado, o amigo perguntou:
- Por que é que depois de te ter magoado escreves-te na areia e agora, depois de te ter salvo escreves-te na pedra?

Sorrindo, o outro amigo respondeu:
- Quando um grande amigo nos ofende, devemos escrever onde o vento do esquecimento e o perdão se encarreguem apagar a lembrança, por outro lado, quando nos acontece algo de grandioso, devemos gravar isso na pedra da memória e do coração onde nenhum vento do mundo poderá sequer suja-lo.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

A carta



Ruth, olhou em sua caixa de correio, mas só havia uma carta. Pegou-a e olhou-a antes de abri-la. Mas logo parou, para observar com mais atenção. Não havia selo nem marcas do correio, somente seu nome e endereço. Ela decidiu ler a carta:
"Querida Ruth. Estarei próximo de sua casa, no sábado à tarde, e passarei para visitá-la. Com amor, Jesus".
As mãos da mulher tremiam quando colocou a carta sobre a mesa.
- "Porque o Senhor vai querer visitar-me? Não sou ninguém especial, não tenho nada para oferecer-lhe..." - pensou.
Preocupada, Ruth recordou o vazio reinante nas estantes de sua cozinha.
- "Ai, não!, não tenho nada para oferecer-lhe. Terei que ir ao mercado e comprar alguma coisa para o jantar".
Ruth abriu a carteira e colocou o conteúdo sobre a mesa: US 5,40.
"Bom, comprarei pão e alguma outra coisa, pelo menos".
Ruth colocou um casaco e se apressou em sair. Um pão francês, um pouco de peru e uma caixa de leite... Ruth ficou somente com US 0,12 que deveriam durar até a segunda-feira. Mesmo assim, sentiu-se bem e saiu a caminho de casa, com sua humilde compra debaixo de um dos braços.
- Olá, senhora, pode nos ajudar? - Ruth estava tão distraída pensando no jantar, que não viu as duas pessoas que estavam de pé no corredor.
Um homem e uma mulher, os dois vestidos com pouco mais que farrapos.
- Olhe, senhora, não tenho emprego. Minha mulher e eu temos vivido ali fora na rua. Bom, está fazendo frio e estamos sentindo fome. Se a senhora pudesse nos ajudar, ficaríamos muito agradecidos...
Ruth olhou para eles com mais cuidado. Estavam sujos e tinham mal-cheiro e, francamente, ela estava segura de que eles poderiam conseguir algum emprego se realmente quisessem.
- Senhor, eu queria ajudar, mas eu mesma sou uma mulher pobre. Tudo que tenho são umas fatias de pão, mas receberei um hóspede importante para esta noite e planejava servir isso a Ele.
- Sim, bom, sim senhora, entendo... De qualquer maneira, obrigado – respondeu o homem.
O pobre homem colocou o braço em volta dos ombros da mulher, e os dois se dirigiram para a saída. Ao vê-los saindo, Ruth sentiu um forte pulsar em seu coração.
- Senhor, espere! - O casal parou e voltou à medida que Ruth corria para eles e os alcançava na rua
- Olhem, querem aceitar este lanche? Conseguirei algo para servir ao meu convidado - dizia Ruth, enquanto estendia a mão, com o pacote do lanche.
- Obrigado, senhora, muito obrigado.
- Obrigada! - disse a mulher.
Foi aí que Ruth pôde perceber que a mulher tremia de frio.
- Sabe, tenho outro casaco em minha casa, tome este. - ofereceu Ruth.
Ela desabotoou o próprio casaco e o colocou sobre os ombros da mulher. Sorrindo, voltou a caminho de casa... sem casaco e sem nada para servir a seu convidado.
- Obrigado, senhora, muito obrigado - despediu-se, agradecido, o casal.
Ruth estava tremendo de frio quando chegou à porta de casa. Agora não tinha nada para oferecer ao Senhor. Procurou a chave rapidamente na bolsa, enquanto notava outra carta na caixa de correio.
"Que raro, o carteiro nunca vem duas vezes em um dia" - pensou.
Ela então apanhou a carta e abriu-a:
"Querida Ruth. Foi bom vê-la novamente. Obrigado pelo delicioso lanche e pelo esplêndido casaco. Com amor, Jesus."
O ar estava frio, porém, ainda sem se agasalhar, Ruth nem percebeu.