Antonio Torrado
Era uma vez, na Roma antiga, um homem
muito rico, que gostava de exibir a sua riqueza em festas fabulosas. Mas havia
um inconveniente.
Como o ricaço tivesse pouca instrução,
com dificuldade acompanhava as conversas dos seus convidados, que apreciavam falar
de literatura e de outros assuntos desenvolvidos em livros, que ele
desconhecia.
Apercebendo-se disso, ordenou ao
governante do seu palácio que escolhesse uns tantos escravos inteligentes e de boa
memória. Para quê? Para obrigar cada um deles a decorar um livro. Queria assim
provar que os livros eram dispensáveis, desde que se dispusesse de escravos
capazes de os saber de cor e salteado.
A aprendizagem dos escravos demorou,
mas ao fim de algum tempo este homem muito rico podia orgulhar-se de possuir a
única biblioteca viva de todo o Império romano.
Sempre que queria mostrar que não
ficava atrás dos seus convidados mais cultos, o homem muito rico batia palmas e
chamava, pelo nome da obra, o escravo que a tinha decorado. Tanto podia ser a
"Ilíada", como a "Odisseia" ou a "Eneida". O
escravo recitava-a, fosse do princípio, fosse do meio, fosse do fim para o
princípio.
De uma vez, estava o homem muito rico à
conversa com alguns poetas e escritores, e quis embasbacá-los.
– Conheço uma passagem da
"Ilíada", que vem a propósito do que estávamos a conversar – disse
ele, enquanto batia palmas – Chamem o "Ilíada".
Mas o escravo que sabia a
"Ilíada" não apareceu.
– Que se passa? – perguntou o homem
muito rico, estranhando a demora.
O governante do palácio, aflito,
ajoelhou-se aos pés do seu exigente patrão e balbuciou:
– Perdoai-me, senhor, mas o
"Ilíada" está com dores de barriga.
Parece que foi a partir deste incidente
que o homem muito rico se resolveu a ganhar instrução pelos seus próprios
meios.
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